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quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Acolhimento (na íntegra)

Quando este blog surgiu, eu procurava divulgar as atualizações de algum modo: para os amigos, exibindo o link em alguma rede social ou despretensiosamente numa conversa de MSN. 
Agora não faço mais nada disso.
Significa que o mais provável é que eu venha sendo minha única leitora pelos últimos meses. 
De todo modo, eu acredito que, quando se escreve algo e se dá publicidade a isso, a menor que seja, essa publicação emana a energia do que foi escrito ali para o mundo exterior. E energia é aquilo que a gente já sabe: corre o universo se transformando daqui para lá até voltar à origem em alguma forma distorcida, não reconhecível, porém correspondente.

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Há algumas semanas, eu escrevi, sendo bastante sucinta, algo sobre como a forma de amar das pessoas me parecia egoísta. Bem. Eu não estava legal. 
Entretanto, há alguns dias, eu fui me encontrar com um amigo que, como a maioria das pessoas que vinha me amando [da mencionada maneira], é mais velho e, não necessariamente por isso, recai sobre a fatal tendência de ter algumas opiniões mais conservadoras ou tradicionais ou, tão somente, políticas de guerra fria, boa vizinhança  e nem preciso dizer que tais não me apetecem. Invariavelmente, sobrepõem a culpa na vítima e aconselham que não se exponha, que se preserve, que previna a agressão com qualquer comportamento no qual se torne prisioneira de si própria.
Sem novas delongas: a conversa foi extremamente acalentadora! Eu, talvez na defensiva, imaginei que soubesse tudo que ele fosse me dizer. Mas fui surpreendida por um discurso completamente acolhedor. Que, por outro lado e tanto melhor, não deixou qualquer firmeza de fora. 
Eu que já não estava mais tão chateada com a forma de amar das pessoas e tentava retomar a postura de aceitar que as pessoas dão somente o que têm pra dar, fui desta vez totalmente desarmada.
Existem, sim, pessoas que amam com olhos capazes de ver além de suas próprias perspectivas e não se acovardam diante de lutas injustas mesmo que estas não se dirijam a elas. 
É como quero ser. É como quero amar. Porque, eu posso garantir, faz toda a diferença ser amada assim.

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Irracionais Anônimos

– Oi, meu nome é Amanda. Eu tenho vinte e dois. E sou uma flertadora compulsiva. Desde muito cedo eu sou assim. Me apaixonei pelas palavras e depois não consegui parar de querer saber aonde elas levam, o que elas trazem, quem afastam, quem atraem.
E tem uma coisa sobre as palavras: os seres humanos estão, há esses séculos todos, tentando usá-las para explicar o amor.
Acho um tanto quanto ousado e ambicioso. E digo isso num tom bastante desacreditado. É, digo, sim.
Eu cresci ao som de músicas que se propunham a cantar o amor. E eu ouvi grandes poetas dizerem que não era possível explicar.
Camões veio avisar e Manfredini replicou toda a contradição do amor. A revisão final suprimiu o derradeiro e de arrebate verso que dizia algo sobre que coisa maluca incompreensível irracional és o amor, Maria.
E eu vim até aqui ouvindo  porém não escutando – os caras. Todas as vezes em que o nome do nocaute era o verbo apaixonar, eu me debruçava sobre aquela chama e queimava o papel com as minhas palavras destinadas a expressar o que era sentir aquilo vazando quente por entre meus poros. E podia dar, meus senhores, detalhes esculpidos.
Amar tem sido um sentimento tão concreto que eu pareci poder ver seus detalhes e traços. Como se nestas vezes todas eu pudesse encarar sua face e completar as peças mais delicadas da figura com o toque. De maneira que não restava sob o céu nada quanto ao meu amor que eu não pudesse dizer e redizer. Explicar e fazer entender.
Perceba: a facilidade de descrever uma foto. Estática imagem, cores seguras e fixas naquela eternidade reprimida no espaço de um momento que passou.
E lá no fundo a vozinha dos poetas clássicos me sussurrava que amor não padece de ter explicação.
Eventualmente, devo ter me sentido foda.
E segui ignorando os parças.
Bem, meus senhores, eis que a poesia virou conto. Acredito que virou, pelo menos, desde que apareceu essa princesa.
Apta a se destacar da mais distinta nobreza que você puder localizar no espaço da história da humanidade. Digo isso porque ela veio subverter tudo. Inaugurando uma dinastia própria.
Não me pergunte o que é o amor sob pena de ouvir uma resposta que muito se parece com o silêncio.
Mas, veja bem, parece-se com. Não o é.
Se puder localizar meus olhos ou descobrir em que direção olham – por vezes para dentro, para alguma coisa dela que do lado de dentro estou tentando guardar –, bem, se você puder fazer isso;
Se puder notar a descida do tom da minha ligeiramente grave voz. Se puder ir conhecer os caminhos por onde andam meus sonhos. Se puder se sentar sobre mim e penetrar a integridade do meu ser e me desvendar como numa possessão, vai perceber que eu não sei do que se trata a porra toda.
Talvez se, ao fazer tudo isso, você não entender nada, acredito que vou pensar que você conseguiu ter entendido.
Este amor como o dos poetas. Que se explica muito mal. E que está vez atrás de vez tentando se re-explicar mais e melhor.
Ela me tomou a convicção do poder de usar o que? As palavras. O poder de usar as palavras para trazer ao mundo tangível aquilo que não se vê, não se cheira. Tão somente se sente em lugares que, fisiologicamente, nem existem pra sentir! Você faz alguma ideia de como isso me pira?
Tomou-me a comodidade do amor pensado.  Do amor entendido. Do amor domesticado que, muito embora seja de saber seguir em chamas, não surpreende com a escolha dos caminhos que incendeia.
Mas ela. Você veja se consegue entender o que eu não sou ainda capaz de explicar. Ela, lá de longe, vai me puxando contra si própria. Eu sei lá se não é se feitiço. Porque, de fato, com meus cinco sentidos racionais não posso compreender como é que ela faz.
Como é que me fez(az) ignorar o que é de se ver em nome do que é, apenas e tão somente, de se desejar. Desejo que arrasta COMO SE inexistisse qualquer obstáculo. Mas como se existisse, ao menos, uma força invisível, laçada em mim, ligada nela, que me arrasta lenta gradativa e inexoravelmente em sua direção. Fazendo-me constantemente querer encostar.
Acredito que, se esse conto se passasse na inquisição, seu destino era queimar, não no meu amor, mas numa dessas enfadonhas fogueiras dos cinco sentidos por aí. 

L i s t e n i n g 
Monte Castelo - Legião Urbana

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Destinatário eu

É assim que pessoas grandes surgem, não é? Quando alguém é bom ou forte ou tem qualquer qualidade fundada na fibra, como é que se faz pra descobrir esse suposto potencial mesmo? É. Você testa essa pessoa. Você a desafia pelo viés das virtudes. Provocando a atuação da fraqueza proporcionalmente oposta à força que você quer ver se floresce.
Assim são as oportunidades para sermos melhores. Parecem-se com chances perfeitas para desistir e fraquejar. Tentar amanhã depois de escolher não insistir hoje.
O que eu quero dizer: ninguém é grande onde tudo é fácil. Você não aumenta sua resistência, não desenvolve resiliência, não exercita a homeostase do seu corpo sem tomar chuvas com rajadas frias de vento que vão querer adoecer você.
É quando o imprevisível se realiza que cai do céu a oportunidade de ser alguém melhor. Quando, meu Deus, o cenário muda repentinamente e você não tem um escudo sequer, a única arma pra enfrentar o que for é você.
Reinvente-se. Seja melhor. Supere seu eu do dia anterior quando tudo era azul e, portanto, fácil ser bom.
Aguarde sem ansiedade o desfecho das agruras.
Você precisa saber que, ao final de tudo, isso se trata de você. Sobre como você lida quando não sabe lidar.
Não abaixe a cabeça, lembre-se que não é uma oportunidade pra desandar tudo de uma vez.
É, porém, talvez, a única ou última oportunidade de saber do que você é feito. Se a carne e o sangue quente que corre em você te fazem de ferro duro.
Você não está aqui a passeio. Seja o seu melhor dessa vez. Isso aí com cara de desgraça é o que você queria pra poder fazer, ser e ter: mais.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Repeat

- Estou me sentindo num carrossel. Estou vivendo um movimento cíclico de altos picos de desejos sobre você. Parece que eu quero estar um pouco bêbada. Mas sinto como se já estivesse, no mínimo, alta. Minha cabeça tá pensando tudo com um filtro de saturação de imagem elevado. Como se estivesse tudo tão quente. Estou sendo sinestésica até. Eu acho que poderia tirar sua roupa e te beijar toda. Num ritmo que eu não sei explicar qual é

E eu fico colocando essa música pra tocar. O cantor está gritando comigo. Mas é comigo feito junto, entende? Estamos suplicando qualquer coisa juntos. Sentindo algo muito forte juntos. E então ele diz algo que eu quero concordar sobre como tudo está on fire. Fucking Jesus Christ como está.

A voz dele me aperta de dentro pra fora. Coisa absurda. Parece que eu vou implodir de ficar querendo você.

Eu já te quis hoje tantas vezes. Sabe? Como se cada vez fosse um querer um desejo separado distinto e autônomo? E isso faz de cada um deles muito mais forte. Porque eles se unem. Eles te querem. Quem te quer assim sou eu.

Estou louca. Porque, quando a música acaba, o silêncio é perturbador. Quero gritar com o cantor mais vezes sobre como te quero. Sobre como estão as coisas on fire e queimando. 

Caralho. Como é bom quando arde.


L i s t e n i n g 
Kings of Leon - Sex on fire